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Harmonizar, rearmonizar. Pra que? (fragmento de um pensamento mais complexo)

*** Dois sentidos de usar o uníssono:
1) Como absoluto, afirmando aquilo que é (quando o acorde ao fim confirma a expectativa)
2) Como surpresa, como dúvida (quando o acorde ao fim é a revelação de algo novo)
 (é claro que ele pode ser visto simplesmente como encontro, almejado ou casual, de duas ou mais vozes - mas isso não é o sentido que estou referindo nesse fragmento)
O uníssono uma nota, qualquer nota, quando entoada como início de uma música, quando vem do silêncio da ausência de uma música é a estabilidade (a referência). Se ficar soando por um tempo maior vira tensão, horror, do qual queremos nos libertar.
Uma harmonia básica está sempre implícita no uníssono (condicionamento cultural e não apenas fenômeno físico). Mostrá-la é vestir a melodia do sentido esperado. Mas também é dotá-la de obviedade.
Rearmonizar é ampliar o sentido, é dar novos sentidos, é dar maior sabor à viagem musical, é ir mais fundo no desequilíbrio, aumentando a emoção do caminho melódico/musical, sempre dando sentido e mostrando que estaremos vivos ao final.
Esses novos sentidos podem ser levados ao extremo, passando por (1) mudança de ares empréstimo modal, modulação temporária, mergulhos maiores em outras tonalidades; passando por (2) caminhos ancestrais as sequências modais com suas propriedades semânticas e dinâmicas que induzem outros estado de corpo e de espírito; passando por (3) campos de gravidades múltiplas (ou indefinidas, ou variáveis) bitonalismo, politonalismo, polimodalismo e, finalmente, passando por (4) outras dimensões o uso de acordes quartais, que dota ao politonalismo uma gravidade resultante, gerando um outro sentido de gravidade, embora comparável à gravidade tonal e modal.
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Arranjo do Itororó 2 flautas

clique aqui para ouvir > Itororó 2 vozes - Teco Galati
Itororó - parte A - modal; parte B - bimodal
 
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Resenha do texto “Aprender” de Luiz Fuganti



Aprender é um processo complexo.


No ensino dominante:
·       primeiro tem que por o indivíduo abaixo de c.. de cobra, desqualificar sua experiência e seu conhecimento, desqualificar até seu movimento corporal espontâneo.
·       depois colocá-lo “em seu devido lugar”; habituá-lo a seguir pra tudo uma ordem lógica idealizada pelo opressor; quantificar e qualificar seus movimentos; domá-lo.


O ensino ativo e potencializador deve ter a experimentação como modo de operação:
·       • experimentação produzindo um enriquecimento instrutivo e agregador sentido mais simples
·       • experimentação a partir de um intenso desejo, produzindo uma diferença no modo futuro do existir


O aprendizado depende:
1. do modo que se extrai o conceito advindo da experiência e como isso se coloca para o indivíduo dali por diante
2. do modo como isso é interiorizado corporalmente (lembrando que a mente é também corpo), de maneira que passe a fazer parte intrínseca do indivíduo

A condição do aprendizado criativo é a constituição de um meio comum afirmativo como princípio motor de diferenciação, meio esse como zona de continuidade autossustentável, continuidade da capacidade sempre crescente de aprender.

Aprender é afinar um instrumento, de dentro pra fora, de fora pra dentro.
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Como percebo meu corpo durante minha prática musical

1.  Ensinando
a.  Aulas de canto: Passo a maior parte do tempo sentado. Uso o violão com mais frequência que o piano. Percebo que as expressões do rosto e do corpo ajudam ao aluno se deixar conduzir aos objetivos da aula, seja a emissão vocal, seja entrar em sintonia com o andamento, como o peso do ritmo musical, a articulação. Então, mesmo sentado, meu corpo reage de maneira diversa conforme a música e o que estamos buscando, e isso reflete no rendimento do aluno. Em diversos momentos fico em pé, principalmente quando o foco da aula está concentrado na postura, na observação das tensões, na respiração e mesmo quando apenas estamos dançando a música para sentir sua essência expressiva.
b.  Ensaios de coral: Nessa atividade eu me movimento muito. No último ensaio uma coralista perguntou, ao final, o que estava escrito na minha camiseta e falou “- Você não fica quieto um segundo, não dava pra ler.” Atualmente a média de idade dos corais que dirijo é alta (media de 50 anos ou mais). Quando lido com pessoas mais jovens as atividades físicas no ensaio são mais frequentes. Mas gradativamente vou buscando complementar o aprendizado do repertório com um fazer musical mais corporal, pois acho imprescindível aos coralistas a noção de que um coro é um somatório de individualidades coordenadas, que um coro, em todos os sentidos e principalmente o musical, é um coletivo e isso significa muitas vozes, muitas cabeças, muita diversidade convergindo para ações conjuntas e não, como vejo na maioria dos corais, como um só grande corpo comandado por uma cabeça. O resultado sonoro é muito diferente, apenas por este único aspecto. O cara que integra esse coro não pode ficar lá, sentado, cantando como se estivesse em outro lugar. Pra voz dele integrar com o resto, com a música que está sendo feita, seu corpo precisa estar presente, ocupar um lugar no espaço, incomodar (no bom sentido) o espaço dos outros, cavar esse espaço físico onde se dará a expressão de sua música.
Então o meu corpo é usado como motor para estímulo de cada expressão particular. Um gesto de entrada é apenas o estímulo para o gesto de cada um no encontro de todos os aspectos musicais que cada corpo traz à tona naquele momento específico de entoar um som.

2.  Tocando
a.  violão ou baixo elétrico: Não me considero um instrumentista. Uso o violão como apoio às minhas atividades. Comecei a estudar baixo elétrico para tentar mudar isso em relação aos instrumentos, pois sempre me vi tocando com desenvoltura bem inferior que cantando ou regendo.
Minha atenção corporal é voltada à postura e à mecânica dos braços e dedos. Observo minhas tensões, faço alongamentos durante os estudos. Mas isso é pouco. Acho que por não ter a música fluindo entre meus dedos a interação música-corpo acaba sendo bem pequena.
b.  Cantando: Apesar de dar aulas de canto, de ter passado grande parte da minha vida ensinando as pessoas a cantarem, poucos foram os momentos em que cantei sozinho. Quando isso acontece não é muito diferente de quando estou ensinando a cantar, cantando junto. Faço uma observação automática de minhas tensões e costumo usá-las de maneira eficiente para esse fazer musical (maxilar, ombros, joelhos e quadris são os pontos mais observados). Talvez isso seja pouco, já que um cantor em cena é quase como um ator em cena, ou seja, precisa saber o que fazer com o corpo porque o corpo está sempre dizendo coisas e o que ele diz deve ser todo coerente com o que está cantando (os significados musical e literário do que está cantando). Busco essa coerência expressiva sem exageros, com economia de gestos - não confundindo com gestos reprimidos (embora em algumas vezes por falta de um repertório de gestos eu prefira não arriscar) - muito parecido ao que naturalmente busquei para a regência coral, ou seja, os movimentos que brotam espontaneamente como se a música surgisse deles e não o contrário.
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O Perigo de Uma só História

https://www.youtube.com/watch?v=_4uXhbSWIJs
A escritora nos fala das consequencias de ouvirmos apenas uma história sobre qualquer fato: o mergulho na ignorância ou a crença em uma verdade parcial e coercitiva. Acessem a palestra no link acima.
"Não por má intenção, mas pelo fato de ser apenas uma só"
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Mal é aprender a fazer som sem aprender a fazer música



Curioso e pertinente o comentário da Enny, que foi mais ou menos assim: 


"Quando aprendi música não se fazia música. A gente tinha que aprender as notas que estavam lá  e pronto. Era música sem música, como é coca-cola sem açúcar, café sem cafeína, cerveja sem alcool."


Outro dia estava lendo um texto que falava sobre a esquizofonia, que é um som estar num lugar onde não há produção desse som, um fenômeno que só existe para o homem muito recentemente, graças (desgraças à parte) aos meios de reprodução sonora, que fazem a gente ouvir uma orquestra sem que haja orquestra tocando.

Música sem músicos, música sem instrumentos, música até sem ouvintes.
Mal é aprender a fazer som sem aprender a fazer música. Pior, nem ter idéia da música que faz, tocar assim como se fosse um rádio.

sobre aula de 21 de março
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Geleswky

Sobre nossa vivência em aula (27.03.11), ouvindo música com o corpo todo. Acho que, do texto todo do Geleswky, esse pode ser um bom quesito a guardar:

"Na verdade, ouvir é uma atividade do silêncio, uma vivência da concentração, um abandono-de-si e gesto puro de entrega; e portanto seria necessário silenciar-se e concentrar-se, abandonar seu ego e se entregar para saber ouvir: e quem de nós está tão pronto?

Essencialmente, ouvir significa abrir-se, e simples e silenciosamente deixar o recebido entrar em si, lá dentro despertando ou aquietando, trabalhando, modificando. E o que foi despertado ou trabalhado pode então, em um movimento próprio, se erguer e se manifestar, responder, corresponder.
Mas sempre a coisa é, primeiramente, ouvir, receber. E portanto é isso que, em primeiro plano, tem que ser desenvolvido, educado, treinado".


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2. Bauman: Desafios pedagógicos e a Modernidade Líquida

O papel dos educadores diante dos novos desafios
 

aprendizagem terciária vs. deuteroaprendizagem

aprendizagem terciária: a que promove a formação de competências de modo a desmantelar os esquemas cognitivos aprendidos antes; não deixa um sedimento duradouro, uma base sólida sobre a qual se pode construir, tampouco conhecimentos que possam sedimentar-se e crescer durante o processo dos estudos; o processo de aprendizagem é uma sucessão infinita de novos inícios, devido ao rápido cancelamento dos conhecimentos pregressos; é vista por Bateson como uma patologia;
deuteroaprendizagem:  é o "aprender a aprender"; lança bases sólidas, integrando as noções adquiridas a novos conhecimentos, permitindo prosseguir pela trajetória escolhida em todas as circunstâncias; torna a conduta dos alunos autônoma.

  Mas o pressuposto sobre o qual se funda o veredicto de Bateson não reina mais. A aprendizagem terciária parece patológica quando combina com o argumento de que a vida de cada um, inconstante e relativamente breve, é inscrita em um mundo estável e imperecível. Mas em uma modernidade líquida, contudo, a relação entre a vida e o mundo sofreu uma reviravolta; se parte agora do argumento contrário, no qual a vida do indivíduo, relativamente longa, é dedicada à sobrevivência em condições frágeis e voláteis através de uma série de "novos inícios" sucessivos




Meu pai não queria que eu fosse músico. Preferia uma profissão mais segura. Hoje todos têm que se adaptar à liquidez dos tempos voadores modernos. Nós, músicos, já estamos vivendo adaptados a esse rítmo há uns 600 anos.
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1. Bauman: Desafios pedagógicos e a Modernidade Liquida


No mundo liquido moderno a solidez das coisas e das relações humanas é tida como uma ameaça; vínculos que limitam a liberdade de movimento e capacidade de embarcar em novas oportunidades que "- olhe ali! Ah... já passou".
O consumismo de hoje não visa ao acúmulo de coisas, mas à sua máxima utilização. Por qual motivo, então, a "bagagem de conhecimentos" deveria ser excluída dessa lei?
Este é o primeiro desafio que a pedagogia deve enfrentar: um tipo de conhecimento pronto para utilização imediata e para sua imediata eliminação.

Modus Operandi na sociedade (trabalho, escola...):
Na modernidade sólida o domínio consistia em estabelecer leis infringíveis, vigiar seu cumprimento, determinar obrigações, realinhar os desviantes ou excluí-los, caso fracassasse os esforço de reformá-los.
Na modernidade líquida a dominação pode ser obtida com dispêndio muito menor: com a ameaça do descompromisso ou simplesmente com a recusa do compromisso. Os chefes não são obrigados a reprimir as idiossincrasias de seus subordinados, a homogeneizar seus comportamentos nem encerrar suas ações no interior da rígida estrutura da rotina.

A arte de viver em um mundo ultrassaturado de informações ainda deve ser aprendida assim como a arte ainda mais difícil de educar o ser humano neste novo modo de viver. 
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