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Deixe a vida me levar, vida leva eu!


Estamos "cada um na sua" e assim entramos na aula. Cada um "com seus problema, mano!" Isso aqui não me interessa, vou vivendo com meu fone de ouvido, não tô nem aí com o que vc quer me dizer, essa porra toda que se dane...

...peraí, mano, que isso fessôr! Pô, ducarái, que bagulho doido, ... cê é lôco, tá ligado!

Dia seguinte

Ei, prô, que que cê vai fazê com a gente hoje?

Na moral, que adianta ficar dando murro em ponta de faca, achando que o problema é aquele ali, está naquele outro, aqueles desajustados?!?!

Ôvo de Colombo: pra quem está interessado, atento, disposto e acostumado a pescar no mar da complexidade. É preciso treino.
Pra quem vê de fora parece mágica.
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Como vc vê a presença do corpo nas suas atividades como professora de música?


Entrevista com Luciana Grillo, musicista, professora de canto e musicalização, atriz.

Em aulas de canto costumo fazer os alunos andarem cantando, movimentar a cabeça, movimentar o corpo, mas tudo - principalmente - para tirar a tensão da região do pescoço. Claro, tem o fato de que o movimento integra mais ao tempo sonoro e o fato de que permite uma maior entrega da pessoa à música.

O teatro me ajudou muito. O uso do corpo, a consciência corporal é muito mais estimulada no teatro que na música.

Em aulas coletivas com crianças uso mais no intuito de brincadeira; jogos musicais, som com movimento, mais que na performance musical. Quer dizer, na performance usamos os deslocamentos pelo espaço e com a consciência de que o corpo se utiliza do lugar onde se produz o som.
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A grama e a Complexidade




Homem é homem. Grama é grama. Simples!


Seis meses depois do falecimento da minha mãe, passei numa locadora e vi que havia chegado o filme “A Vida é Bela”, do Benigni. Lamentei minha mãe não tê-lo visto no cinema, na época ela já não conseguia ficar sentada tanto tempo. Mas ela iria adorar se eu pudesse levar a fita para casa. Com certeza ela, filha de italiano, iria ver alguns aspectos com mais propriedade que eu que era apenas neto. Eu não cheguei a conviver com meu avô, sabia das histórias ou da personalidade dele apenas pelo que ela me falou.

A última vez que fomos ao cinema vimos o filme “Central do Brasil”. Falamos muito sobre isso, sobre ver a vida através de uma pessoa tão diferente, sobre a transformação que a personagem interpretada pela Fernanda Montenegro foi tendo ao longo do filme. Para minha mãe foi também um pequeno renascer, esse momento teve uma profundidade um pouco maior. Parece que a pessoa que sabe que está chegando ao fim fica um pouco menos apegada aos seus valores, fica mais aberta a admitir outros modos de vida, fica admirando essas outras maneiras de ser, fica até com uma ponta de arrependimento por coisas que não viveu porque não se permitiu.

Pensei no que conversaríamos após assistir “A Vida é Bela”, no quanto ela iria se transformar desta vez. Então me peguei pensando: “Que besteira, ela está morta. Morta! Que adiantou para ela ter visto “Central do Brasil”, que adiantaria ver isso agora? Enquanto estava viva sim, fazia sentido, mas agora? Tanto faz pra ela ter visto ou não”.

Engano, achar que a pessoa que se foi acabou no momento da morte é de uma simplificação absurda. Se o modo cartesiano de pensar libertou o homem da tirania do catolicismo medieval, de outro modo o escravizou à uma concepção simplista e linear da vida. A pessoa nasce, cresce e morre. Pronto. Como um carro, como qualquer bem de consumo. Antes de ser um paradigma cartesiano, é uma concepção patriarcal, herdada por Descartes. (Ver comentário “1. cegueiras paradigmáticas” abaixo dessa postagem)

Numa sociedade rural até mesmo nos dias de hoje a relação mais íntima do homem com a natureza faz com que ele veja mais claramente que a vida é norteada por fazeres cíclicos. Num período ele ara a terra, noutro ele semeia, depois tem a época só de cuidar, tem o tempo de colher. No outro ano é a mesma coisa. Existem também os ciclos menores, as luas boas para podar, para pescar, para cortar o cabelo. O ciclo menstrual faz a mulher mesmo a mulher urbana estar mais sintonizada à ideia de período, e essa visão circular da vida é, por isso e outras coisas, mais feminina, é a concepção matriarcal da vida.

Ciclos maiores e menores. Não como as engrenagens do relógio de Descartes, mas como espirais. Existir o ciclo do meu avô, o ciclo da minha mãe, o meu ciclo, o ciclo dos meus filhos. Minha existência não dependeu da existência do meu avô apenas até o momento de minha mãe ser gerada, nem da existência dela até o meu nascimento. O que eu sou é parte do mesmo espiral o que ele era não morreu com seu corpo mas é parte intrínseca de mim, em tudo o que creio ser o mais íntimo, o mais eu: minha personalidade (indivíduo), minha identidade (o que me une e separa do restante da humanidade como sociedade) e minha essência (o que me une e separa do restante da humanidade como espécie).


Assim é o homem.


Mas e a grama?

Graminhas nascem, graminhas morrem e vivem gerações em espiral. Será?

Sei que a grama que está no jardim de casa eu peguei a muda lá na Gávea, no campo do Flamengo. Não é qualquer grama não, é a mesma grama que o Zico pisava durante anos. Como assim, a mesma grama?
Foi uma muda, e como toda muda, é um pedaço daquela grama que cortei, que tirei do gramado assim como se tivesse tirado um dedo seu. Aí ela cresceu e se esparramou pelo jardim todo da minha casa, como se o seu dedo crescesse e você se esparramasse por todo o jardim da minha casa.

A grama da Gávea não é qualquer grama. Tem história, tem cultura, tudo bem que ela não sabe. A gente diz que ela é filha da grama que o Zico pisava, diz assim, pra todo mundo entender sem ter que ler esse texto, mas na verdade ela é a grama que o Zico pisava e é isso que confunde a cabeça de nós homens, porque não sabemos pensar como grama, se grama por acaso pensasse. Esse é o sentido do texto do John Donne, que abre o texto do Humberto Mariotti sobre a complexidade. 

“Nenhum homem é uma ilha; qualquer homem é uma parte do todo. A morte de qualquer homem me diminui porque faço parte da humanidade. Assim, nunca procures saber por quem dobram os sinos: eles dobram por ti.”


A Grama, se pensasse, poderia saber que ela tem uma relação com o gramado maior do que a maioria dos homens acham que possuem com a humanidade. Porque a grama, se não fizesse um teste de DNA ficaria confusa em ver outra grama e saber se a grama é outra ou é ela mesma.


Em várias tribos indígenas da América do Sul a menor célula social é a grande família, que para nós seria juntando os primos e tios. O que acontece é que uma criança considera como pai o seu pai e os irmãos dele, como mãe sua mãe e as irmãs dela. Por isso quase não existe criança órfã numa aldeia, pois se seu pai verdadeiro morre ele tem outros pais e a dor da perda é minimizada, no imaginário e no real, porque ele não vai passar mais dificuldade, não vai passar fome, ele tem muitos outros pais.

O modo de pensar a organização familiar fez deles um pouco mais grama que nós.



E a complexidade? 
A complexidade é um fato, não um conceito. O pensamento complexo é que é uma visão de mundo, um paradigma, o paradigma da atualidade, que necessitamos para compreender o mundo de uma maneira mais completa que o raciocínio cartesiano.

Pelo paradigma cartesiano homem é homem, grama é grama. Pelo paradigma da complexidade, homem é, ou poderia ser, se quisesse, como grama, parte de algo maior. Parte da humanidade, parte do mundo natural, parte também de um mundo das ideias, do outro mundo criado pelo pensamento. Até Stalin, materialista, dizia que o pensamento é a forma superior da matéria.

O poder de um olhar diferente é muito grande. O olhar cartesiano transformou o homem, que transformou o mundo natural e colocou-o à nossa disposição, melhorando muito nossa vida. Agora há outros desafios para a humanidade e o paradigma cartesiano não responde mais a muitos deles.



Um exemplo de mudança pelo olhar diferenciado.

No período de invasão romana na palestina os judeus fizeram uma importante modificação nas suas leis. Uma mudança de olhar que garantiria a preservação de seu povo. Como? Até então, seguindo as tradições, os direitos de títulos e identidade eram passados de pai para filho de uma geração a outra, ou seja, a patrilinearidade. As legiões romanas ficaram conhecidas por uma prática comum: o estupro. Para os romanos era o significado simbólico de poder tomar as filhas da nação conquistada, usurpar da descendência, ter os ventres de Israel semeados por outro povo trazendo ao mundo filhos de Roma. Era mais que apenas saquear o presente, era apossar-se de seu futuro. A matrilinearidade foi a solução simbólica e legal para essas crianças sem pais de Israel e garantiu a esse povo que elas seriam a continuidade de um povo que não se permitia subjugar.

A mudança que a principio não foi material. Foi um novo olhar. Um novo paradigma que permitiu a sobrevivência de uma cultura.


Vou terminar com um trecho do que Edgar Morin escreveu em “Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro”

Por isso, a educação deveria mostrar e ilustrar o destino multifacetado do humano: o destino da espécie humana, o destino individual, o destino social, o destino histórico, todos entrelaçados e inseparáveis. Assim, uma das vocações essenciais da educação do futuro será o exame e o estudo da complexidade humana. Conduziria à tomada de conhecimento, por conseguinte, de consciência, da condição comum a todos os humanos e da muito rica e necessária diversidade dos indivíduos, dos povos, das culturas, sobre nosso enraizamento como cidadãos da Terra...

Como assim? Enraizamento?
(brincadeirinha...)
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Arranjo - Mulher Rendeira - duas vozes


Para ouvir, clique no título. Para ver melhor ou baixar, clique na partitura.

Mulher Rendeira - para coral a duas vozes




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Planejamento


Por que é necessário? Para viabilizar tudo o que propomos.

Por que a aula sempre sai fora do planejado? Porque os alunos estão vivos!!! (Enny)
 
Planejamento não é proposta. Proposta é o que você acredita como ensino, quais abordagens, quais linhas pedagógicas de referência, seus valores como professor, seus valores como músico, seus valores como homem.

Planejar é preciso, mas não deve ser preciso.
(Cassia Maria)
Porque quanto menos houver precisão mais podemos navegar solto rumo às nossas propostas, levando em conta que alunos vivos são como ventos e oceanos, não dá para prever tudo (ainda bem!).
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Por que ensinar arte? Finalmente uma resposta satisfatória.


Marx dizia: “Os produtos do cérebro humano têm o aspecto de seres independentes, dotados de corpos particulares em comunicação com os humanos e entre si”.
Edgar Morin  acrescenta: “as crenças e as idéias não são somente produtos da mente, são também seres mentais que têm vida e poder. Dessa maneira, podem possuir-nos. Devemos estar bem conscientes de que, desde o alvorecer da humanidade, encontra-se a esfera das coisas do espírito , com o surgimento dos mitos, dos deuses, e o extraordinário levante dos seres espirituais impulsionou e arrastou o Homo sapiens a delírios, massacres, crueldades, adorações, êxtases e sublimidades desconhecidas no mundo animal.”

Uma vez, enquanto assistia as aulas de um curso do método Kodaly, perguntei ao palestrante húngaro onde estavam os supermúsicos húngaros e por que ainda não haviam invadido o mundo com seus superpoderes?

Ele me respondeu: “Kodaly e Bartok não estavam interessados em criar supermúsicos mas sim em criar um superpúblico” (POW, que porrada na cara!!!).

Disse ainda que acreditavam que o povo húngaro era um povo bárbaro, sem educação, sem o espírito preparado para ouvir o que eles, não super, mas grandes músicos húngaros criavam. Que se criassem um sistema de educação musical para toda a população provavelmente estariam ajudando a tirar esse povo da barbárie.

Não tenho ideia se eles tiveram acesso ao que Vigotsky, pensador russo, escrevia sobre o assunto, mas parece até que sim, vejam só:
Desde tempos remotos compreende-se o sentido da atividade estética como catarse, ou seja, libertação do espírito das paixões que o atormentam. 

A emoção estética tem uma natureza dialética: a contradição, a repulsão interior, a superação e a vitória são constituintes obrigatórios do ato estético. É necessário ver o feio em toda sua força para depois colocar-se acima dele no riso. É necessário vivenciar com o herói da tragédia todo o desespero da morte para com o coro elevar-se sobre ela.
A arte implica essa emoção dialética que reconstrói o comportamento e por isso ela sempre significa uma atividade sumamente complexa de luta interna que se conclui na catarse. A arte não é uma complementação da vida mas decorre daquilo que no homem é superior à vida.

A humanidade acumulou na arte uma experiência tão grandiosa e excepcional que qualquer experiência de criação doméstica e de conquistas pessoais parece ínfima e mísera em comparação com ela.

Por isso, quando se fala de educação estética no sistema de educação geral deve-se sempre ter em vista essa incorporação da criança à experiência estética da sociedade humana: incorporá-la inteiramente à arte monumental e através dela incluir o psiquismo da criança naquele trabalho geral e universal que a sociedade humana desenvolveu ao longo dos milênios, sublimando na arte o seu psiquismo.
Aqui reside a chave para a tarefa mais importante da educação estética: introduzir a educação estética na própria vida. A arte transfigura a realidade não só nas construções da fantasia mas também na elaboração real dos objetos e situações. A casa e o vestuário, a conversa e a leitura, e a maneira de andam, tudo isso pode servir igualmente como o mais nobre material para a elaboração estética.


Fiquei assombrado quando assisti um vídeo de um programa de auditório da Noruega. Parece um tipo de “Qual é a música”. Vale a pena ver, não só pela música e pela qualidade da cantora mas, principalmente, pela qualidade do público.

O silêncio visto aqui não é apenas uma atitude de respeito ao artista, ao outro que também ouve, mas antes de tudo um respeito a si mesmo, respeito ao espaço/tempo criado pela arte, que o espírito tanto necessita para chegar à sublimação.

Morri de inveja. Morri escutando a música. Morri ao ver/ouvir a cantora.
Quero mais é que vocês morram também.


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A solução da educação brasileira está na mão das professoras maluquinhas?

A midia elegeu, o povo elegeu, os tecnocratas elegeram, os polícos e os demais elegeram que a educação é o grande mal brasileiro e por isso mesmo poderia ser a solução do Brasil. E todos crêem saber a solução dos problemas.

Na Rede Globo estava passando uma série de reportagens sobre a educação, mostrando seu ponto de vista,  recheado de idéias do senso comum, entre as quais que uma das saídas mais eficientes seria a do bom professor, aquele que faz a diferença.

Claro que a um professor deve caber a motivação e o bom preparo, mas se na maioria dos casos não teve bom preparo, porque sua formação já foi ruim e não tem muito incentivo para manter-se motivado, como sair desse moto-contínuo?

A professora Amanda foi na mosca! Entre muitas coisas importantes que disse destaco aqui: "Eu gostaria que dizer aos senhores que se libertem dessa concepção errônea, extremamente equivocada de associar qualidade de educação com professor dentro da sala de aula". O que ela fala ainda não é a solução, mas é uma análise sintética dos problemas estruturais do ensino.

Ela tem jeito de ser uma professora maluquinha, mas de bobinha não tem nada.
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