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Aula de Canto com Teco Galati

 Canto: Técnica e Interpretação através de Canções


A técnica - a construção da sonoridade

Combinadas com exercícios e vocalizes que complementam as necessidades técnicas, as canções serão indicadas para agir na materialidade de sua voz. 
É o trabalho de luthieria, de construção e reparo do seu instrumento. Por isso, imprescindível em qualquer fase, desde os iniciantes aos cantores experientes.
Um repertório que se ajusta ao seu corpo, ao conjunto instrumento/instrumentista, para que você:
  • aprenda/desenvolva o domínio da pressão do ar nas cordas vocais
  • trabalhe a sustentação de notas longas
  • domine sua afinação em notas longas ou ágeis
  • controle sua projeção sonora pelo uso da ressonância e não pela força
  • saiba usar a leveza ou peso da emissão como componentes de seu timbre
  • use e controle melhor seus ressonadores, inclusive os que nem costuma usar. 
  • domine seus vícios de articulação

A arte - interpretação
Canções para desenvolver a capacidade artística do cantor e viabilizar essa necessidade, muitas vezes inata, de se expressar. É o momento quando a técnica se coloca a serviço da estética, momento de aprofundar o conhecimento dos estilos musicais (repertório do estilo, da época, estudo dos intérpretes, da estética do estilo e do momento histórico dessas canções que o aluno traz para trabalhar em aula ou que colocamos como o treinamento da vez.


Além desses aspectos, dois outros de muita importância poderão ser trabalhados, desde que em acordo com o aluno:

1. Estudo mais aprofundado da linguagem musical - percepção auditiva, teoria musical, harmonia, leitura de partitura, rítmica, ouvido harmônico, introdução ao violão ou piano.

2. O trabalho de orientação na pré-produção de um show ou gravação de mídia, desde a escolha de repertório, a indicação de músicos, delineamento de arranjo, proposta estética, necessidades técnicas de equipamentos, etc.

 




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Três estudos para Piano


Para ver com detalhes ou baixar a partitura, clique na imagem. Para ouvir, clique no título.

Fui no Itororó

para um bom treino da mão direita

Galo Garnizé

para velocidade

Mulher Rendeira

boa para começar a coordenar ritmos brasileiros
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O efeito Acetato sobre Partitura



Um arranjo, o que é?

Costumamos chamar de arranjo coral a adaptação para um grupo coral de uma canção popular gravada originalmente para instrumentos e voz. Os arranjos corais começaram a ter uma profusão no Brasil quando Damiano Cozzela andou a fazer um trabalho lindo para o Coralusp, ainda na década de 60. Durante as décadas seguintes esse tipo de repertório se tornou hegemônico. Antes de mais nada é importante ter em mente que qualquer obra coral ou instrumental é um arranjo, mesmo quando a composição já nasce completamente dependente do modo como os sons são propostos, ou seja, arranjados. Quando é para orquestra costumamos chamar de orquestração. Uma sinfonia do Beethoven é um arranjo para orquestra. Uma ópera barroca é um arranjo para coro, solistas e orquestra. Uma faixa que ouvimos dos Beatles ou do Clube da Esquina é um arranjo. Costumo dizer, às vezes, que não existe música ruim. Existe arranjo ruim, ou interpretação ruim. O Pour Elise que o caminhão de gás toca é um arranjo ruim com interpretação ruim, e não uma música ruim.

Partitura...

Quando escolho a partitura de um arranjo para fazer um coral cantar, sei que ali estão as coordenadas gráficas bem precisas que vou transformar em som. Ali deverão estar resolvidas as questões rítmicas, melódicas e harmônicas (no mínimo) da música que desejo realizar. O arranjo nasce, geralmente, de uma adaptação para o coral, do que era original de uma determinada, gravação, ou seja, de um outro arranjo. Um arranjador pode querer ser fiel à harmonia original, ou então, pode rearmonizá-la. O arranjador vai distribuir essa harmonia em um número de vozes que pretende abrir. Assim pode criar homofonia ou polifonias com essa finalidade.
A linha melódica pode se conservar fiel à original ou pode sofrer pequenas modificações, principalmente quando essa melodia passa de uma voz para outra frequentemente. Nesse processo são construídos outros sons que dão o sentido musical almejado, e a partir daí, ao reconhecimento da música pelo ouvinte, mesmo ela soando diferente. Pelo fato de criar melodias que soam simultâneas à melodia original, o que vemos é a criação de outra música, mais ou menos semelhante à original, quer dizer, ao arranjo original que conhecemos ou temos como referência. É bom ficar atento que estamos aqui nesse papo, falando somente da parte musical da canção e não da letra como texto, como literatura. Insisto que o funk não é ruim. Vocês que andam ouvindo no lugar errado.

Fidelidade à originalidade. Pode isso?

Quando uma banda faz “cover” de outra banda, tem isso como objetivo bem especifico por alguma razão, geralmente atender a um publico que gostaria de ouvir os “Beatles ao vivo” mas, por razões obvias, isso não é possível. O intuito do "cover" é imitar. Tem publico tão exigente que até os erros da gravação quer ouvir. Outras bandas preferem fazer a sua versão, ou seja, seu próprio arranjo, estando livre para inserir muita coisa diferente. Músicos geralmente deixam sua marca no som que produzem. Um tema, o nome de música, é apenas uma desculpa para fazer sua própria música, para vestir uma ideia musical materializada num registro com as coisas que estão na cuca dos que a executam. Pense nos jazzistas, que pegam um tema, fazem uma seção inteira e a partir daí jogam o tema fora e vão criando melodias incríveis e logo substituindo por outras melodias incríveis na próxima seção. Tem a inda o free jazz, que após a exposição do tema já parte para improvisações completamente livres em harmonia e ritmo.

Bem, mas e o Acetato?

Acetato é aquela folha plástica transparente que usávamos para escrever ou desenhar no retroprojetor. Mas se você pega o desenho feito no acetato e o coloca sobre uma partitura, você vê que já tem uma alteração gráfica ali. A alteração é vista como uma sujeira que atrapalha a leitura da partitura. Mas pode acontecer de algum signo musical aparecer lá, ao acaso, e você, ao ler sem querer aquele novo signo musical, acaba gostando do que ouviu e resolve fazer sempre assim.
Pois bem, ao invés de deixar a cargo do acaso, você pode resolver escrever diretamente na partitura algumas pequenas modificações — um sinal de stacatto, uma nova nota pra soar junto, alterar um tempo de uma figura musical. Tudo isso poderia ser anotado num acetato que você coloca sobre a partitura, como se fosse apenas para separar o que é original do que é fruto da musicalidade do intérprete, no caso, você. E um regente de coral, pela particularidade que possui cada grupo, está adaptando a interpretação o tempo todo.  Não existem dois coros iguais no mundo. Não existem nem dois ensaios iguais.

Então, aonde você anota, tanto esses detalhes de interpretação como alterações mais profundas? Num caderninho? Não, na partitura, certo? O que você faz é um Acetato sobre Partitura, só que de maneira mais suja. Mas tudo bem anotar lá, é o melhor lugar mesmo. Já pensou fazer isso num acetato de verdade… ia ficar uma bagunça aquele montão de plástico caindo da pasta.

Então temos o ACETATO SOBRE PARTITURA como um conceito. E quando algo tem nome, tem cara. Se torna algo distinto. Como nossas mentes são simbólicas, criamos uma imagem abstrata, apalpamos o conceito, damos vida própria e distinguimos essa entidade das outras. Começamos a fazer um uso mais consciente, começamos a dominar e ampliar suas possibilidades. Aprofundamos o conceito.

Esse é o conselho que dou aos regentes que fazem arranjos meus:

adeque,
reduza,
amplie,
mude as barras e fórmulas de compasso,
troque vozes,
mude até oitavas, se achar que soa bem.
Ouça,
ouça muito,
ouça profundamente, detalhadamente,
mesmo que tenha que gravar pra conseguir isso.

Confie nos seus instintos, baseie-os no seu conhecimento.
Amplie o conhecimento sempre que preciso
(sempre é preciso).

Criou trecho com escala estranha?
Pesquise escalas exóticas,
crie escalas novas, se necessário, se isso resolver problemas técnicos ou de puro gosto.

Exagerou?
simplifique.
Encontre o essencial.


Um belo dia você apresenta a música a uma platéia e perguntam: 
— Que lindo! É seu arranjo?
você balbucia ao responder que não, porque já não sabe mais se se aquilo que a pessoa ouviu foi coisa do arranjador ou arte sua.

Então chega a hora em que você talvez precise colocar isso tudo num papel, ou seja, escrever o seu próprio arranjo, mesmo que eventualmente.

Qual o limite entre uma pequena adaptação e um arranjo novo?
A gente sabe.
Porque sempre estamos fazendo acetato sobre partitura.

Mesmo os mais puristas fazem escolhas próprias ao articular um fonema ou uma ligadura.
Fazemos isso sempre e isso já é um acetato sobre partitura.

Então,
é só isso.
Use esse conceito.

Então… 
é tudo isso. 

Não esqueça que você deve, quer dizer, não esqueça que você vai colocar acetatos sobre a partitura do seu próprio arranjo.

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Semiótica para músicos: Uma obra musical é um objeto ou um signo?


A sina de uma música (uma composição) é ser um signo sem objeto. Pensemos junto: qual o objeto dinâmico da Variação nº 25 (clique aqui e assista um pouquinho do Glenn Gould tocando; vale à pena ver além de ouvir) das Variações Goldberg de Bach (BWV988)? A partitura, quando ele terminou o esboço? A partitura, quando foi impressa? A partitura, ainda como representação mental, locus dos quali-signos acústicos contidos na memória de Bach? Ou simplesmente o conjunto de fenômenos acústicos que foram/vão acontecendo ao longo do tempo da execução? Qual execução? A real, quando a tocou, ou a virtual, quando imaginou a obra?




Uma composição é um conjunto de fenômenos acústicos e estes podem ser encarados como objetos acústicos. Mas que espécie de objetos? Materialmente não passam de ondas e uma onda não é nada mais que uma perturbação energética na matéria. Mas a composição em si – não a partitura que carrega uma série de símbolos musicais – mesmo para Bach, essa composição, o objeto dinâmico Variação nº 25, não existe. O que existe é um objeto imediato, que na realidade é um conjunto de qualidades acústicas, e como parte integrante do signo, não é estático. O objetivo do compositor ao criar a composição é que esta seja um signo que represente ele próprio (signo).

No caso específico da Variação nº 25, sabemos que foi composta a partir de um tema num processo de inversões, retrógrados, imagem espelhada, etc. São processos que parecem muito mais imagéticos, de manipulação de um objeto quase palpável (a pequena estrutura melódico-rítmica do tema de Goldberg), transformados em música por Bach mediante esse procedimento que incluiu a expansão, a contração e mudança de altura que parecem mais manipulações de um escultor que de um músico. A semelhança do processo entre esses dois fazeres artísticos não é casual. O signo final Variação nº 25 nasceu da representação de uma estrutura acústica simples, assim como a Pietá nasceu de uma rocha de mármore. Ambos, a rocha e a pequena estrutura melódico-rítmica do tema de Goldberg não eram objetos de valor artístico.


Uma complexidade de signos na unidade de uma composição, daí também sua característica de ambiguidade, de possibilidades infinitas sempre que há um novo intérprete musical, sempre que há uma nova execução pelo mesmo intérprete – ainda que queira executar da mesmíssima maneira, estando sujeito às variações de sua percepção e de seu controle motor – sempre que há uma nova execução, mesmo se realizada através de um meio mecânico ou eletrônico, pois cada vez que é tocada outros signos, sonoros ou não, interferem na apreensão deste. Também pelo motivo de que quando escutamos a obra musical estamos sujeitos às variações da percepção dos fenômenos acústicos, parte por causa dos nossos órgãos de percepção, que não funcionam sempre da mesma maneira, e parte pelo fato de que nossa mente sempre vai agregando novos julgamentos de percepção (e jogando fora outros), julgamentos que são afetados tanto pelo que acontece fora de nós, como pelo que está acontecendo no interior da nossa mente.
Podemos ir adiante e afirmar, ao menos como uma arguição, que quando um compositor olha para sua obra e não a vê como objeto real – porque esse objeto não existe – mas sim como objeto imediato, este, o compositor, já não é algo fora do signo “composição” que ele criou. Ele mesmo faz parte do signo. Essa composição não existe enquanto não existe a mente do compositor como signo componente do objeto imediato ‘composição’. E podemos estender esse fato ao intérprete, que não é potencialmente um intérprete enquanto não tiver transformado aquele objeto partitura, por exemplo (que é apenas uma composição em hipótese ou composição em potencial), em um objeto imediato, momento em que ele mesmo se tornará signo, a parte primeira do signo.
Embora não possamos verdadeiramente avaliar a maneira de Bach perceber sua obra Variação nº 25, é evidente que para um intérprete como Glenn Gould a percepção é completamente diversa, não só pelas variações de percepção citadas acima, mas pelo olhar original: Bach viu a pedra (e vislumbrou o processo). Glenn Gould viu a Pietá.
Uma coisa é certa: tanto qualitativamente quanto quantitativamente é muito distinta a exigência do conhecimento da estrutura da composição que um intérprete deve ter para executar Bach – o Bach nas variações Goldberg – do que se compararmos à exigência do conhecimento da estrutura na obra minimalista como as de Phillip Glass, salvo alguma exceção. Então vemos que, embora tudo seja música, a diferença de propósito na criação da obra confere à criatura padrões diferentes de significância. A importância da compreensão estética da harmonia é fundamental nas Variações Goldberg. Não que não seja importante em Phillip Glass, mas não é sobre as nuances da harmonia que a música de Glass tem significado mais importante. Em Glass o intérprete deve ter em mente a geografia da obra muito mais clara e permanente que em Bach. Fazendo uma metáfora, em Bach o intérprete tem que prestar atenção em cada passo enquanto que em Glass ele deve prestar atenção em cada quadra.
Mesmo o ouvinte de Glass: se ficar querendo prestar muita atenção em cada passo não suportaria ouvi-lo. O ouvinte deve prestar atenção no macro da peça, deixando-se transpassar com prazer pela infinidade de sons que estão presentes naquele espaço de tempo, um prazer mais físico que prazer emocional ou intelectual, como costuma acontecer na escuta contemplativa da obra de J. S. Bach.

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Danças e Percussão Brasileiras - Prof.ª Kelly Guimarães


Dia 23 minha filha me convidou pra ir ao morro do querosene, bairro da zona oeste de São Paulo, pra ver o batismo do Boi, do Boi-bumbá. Há 30 décadas mudou para esse lugar um maranhense de Cururupu, que ainda menino iniciou seu aprendizado nas danças e festividades populares e passou sua infância vendo e ouvindo de perto os bumba-bois de costa-de-mão. Trouxe para cá sua experiência e sua capacidade de reunir pessoas em torno de suas atividades, dando de presente à cidade de São Paulo uma festividade de Boi-bumbá tão autêntica como a que presenciava na sua terra natal. Tem pessoas no morro do querosene que nasceram na tradição do Boi-bumbá, como se o Boi ali sempre existisse. Tem muita gente no morro do querosene que sabe tudo do Boi-bumbá, como se em Cururupu tivesse nascido.



           
Levei ao morro um garoto de 22 anos, colombiano, que estava de passagem, hospedado em minha casa. Ele estuda na Argentina, passou por aqui por acaso, a caminho do Rio de Janeiro, a cidade maravilhosa. No sábado à tarde, presenciou um por de sol com céu azul claro muito luminoso e nuvens esparsas cor-de-rosa. Tinha até, de quebra, uma meia-lua minguante oriental brilhando no meio do céu. Acho que se algum carioca falar que São Paulo é a terra poluída da garoa ele vai acreditar que todos os cariocas mentem. Mas o que ele mais ficou boquiaberto foi ver a diversidade de pessoas, de etnias, de classe social, presentes ali, dançando e cantando ao som do batismo do Boi. Ver a escandinava loura tocando a onça – aquela cuíca enorme e grave – o árabe cantando um verso no improviso, a burguesinha improvisando ao violino, a criançada branca, negra , indígena, mulata, dançando todos os passos na grande roda junto aos velhos, ver as três japonesas cangaceiras, aquilo tudo pareceu para ele o paraíso da diversidade, uma impressão até de que aqui não existe a divisão de classes, que não existe o racismo.



As festas populares, principalmente as festas com dança, acompanhadas dos instrumentos que são os mesmos em festas populares do mundo todo tem esse poder de reunir as pessoas, de criar momentos onde a humanidade se torna um pouco mais humana. Os mesmos instrumentos e na Colômbia, terra do Felipe, meu hóspede, produz uma música tão diferente. Lá no país dele esses festejos não reúnem as classes sociais como aqui em São Paulo. Lá ainda é preciso fazer um trabalho de valorização da cultura popular como já se faz por aqui há alguns anos, mesmo que devagar e pouco abrangente, graças à dedicação de muita gente, tanto de gente que pertence desde pequenos a esse mundo extenso, mas pequeno, da cultura popular, como da elite intelectual e artística brasileira.
   
Para mim, que já conhecia o morro do querosene e suas festas do Boi, a maior surpresa foi perceber – apesar da quantidade de celulares em ação, falando, filmando ou tirando fotos, apesar da iluminação pública, apesar de toda urbanidade presente – foi perceber em determinado momento, como aquela festa nos colocou em outro tempo, outro espaço, nos permitindo ouvir e se movendo com todo o corpo ao sabor de um ritmo primitivo que pertence a todas as culturas de todas as épocas. Aquele som que eu presenciava não surpreenderia o homem que vivia há 5.000 anos. Ele poderia entrar na roda, cantar e dançar com todos, para, no final da folia, beijar aquela turista americana high tech, que mandaria por seu iPhone, para seus amigos, a foto daquele autêntico paulista que encontrou naquela festa exótica.

Nas aulas de danças e percussão brasileiras, aprendi pra valer, com a Prof.ª Kelly, que não podemos desperdiçar a força que essas tradições possuem. Como professor de música não posso perder a oportunidade de criar momentos onde meus alunos possam conhecer mais de perto essas tradições, seja através das músicas, danças, das artes plásticas, através das histórias. Não virtualmente, mas tocando, dançando, criando instrumentos e vestimentas, contando e ouvindo as histórias. Levá-las ao morro do querosene depois de tudo isso seria o máximo, não?
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PESQUISA SONORA E IMPROVISAÇÃO




Talvez a tarefa mais difícil da introdução da improvisação na prática do ensino musical seja a indução à necessidade de improvisar. Como fazer o aluno ficar motivado para essa atividade? Como deixá-lo desinibido ao ponto de permitir-se a essa expressão espontânea e criativa?
A proposta dada em aula pela profª Enny Parejo foi fazer essa introdução através de estímulos corporais, através do movimento corporal, através de uma dança sem coreografia, de uma dança que nasce do corpo focado nele mesmo (claro, isso foi como eu vi). A eficiência dessa indução dá-se pelo fato de que música é movimento, que a música está sempre associada ao movimento do objeto sonoro que vibra produzindo som e ao corpo que colocou o objeto em movimento. Levar o movimento corporal da dança ao objeto sonoro é fazer esse objeto produzir um som análogo ao que o corpo já aspirava ao dançar, mesmo que não soubesse que som seria esse.

Talvez por isso a primeira etapa da improvisação como prática do ensino musical deva estimular à pesquisa sonora, não apenas como se fossemos revelar o som contido em cada instrumento ou objeto sonoro, mas para demonstrar que a qualidade do nosso movimento leva à produção de sons particulares em cada objeto sonoro. Essa atividade é o que liga a audição ao movimento, a audição com interesse musical ao movimento com interesse musical (ou, como Paynter coloca, entre o som e a técnica).



A segunda etapa da improvisação como prática do ensino musical foi a associação de sons criados em objetos sonoros e o seu emprego como sonorização de histórias. É uma utilização prática de sons encontrados numa pesquisa sonora que se baseia em duas etapas: 1. escuta dos sons ambientes (de diversos ambientes) tanto dos sons naturais desse ambiente (vento, água, rio, cascata, chuva, mar, sons dos animais, passos) como de objetos ou ações criados por humanos (porta, carroças, carros, manivelas, rodas, molas, talheres, passos, conversas, risos); 2. recriação desses sons através de objetos sonoros distintos dos originais.
A sonorização de histórias é uma atividade que obriga o executante a estabelecer uma estruturação sonora, mas ainda num estágio anterior à formação de uma linguagem musical.  Desse modo, relaciona sons a um universo exterior ao universo musical. Serve então, para representar ou se referir a coisas, a ações e movimentos, até mesmo sentimentos, mas sempre por semelhança, por contiguidade ou por convenção. Se sonorização ainda não é música ­ porque não faz sentido em si própria ­ é um caminho para a música, tanto pela audição ativa como pela exigência de uma habilidade técnica motora (mesmo que básica) e pela indução à habilidade artística construtiva, na hora de estruturar essa sonorização. Por isso também que nas obras musicais há muito de sonorização.



A terceira etapa da improvisação como prática do ensino musical é a que leva a procurar a associação dos sons com outros sons com finalidades exclusivamente musicais, ou seja, signos musicais concebidos como qualidades acústicas, sua existência própria e suas leis de organização internas. Essa é a etapa em que a improvisação aponta para a criação de música, só música, exclusivamente música.
Nessa etapa a habilidade técnica motora requer maior domínio; então a atividade também tem a finalidade de estimular o desenvolvimento da habilidade técnica. Nessa etapa a habilidade artística construtiva requer maior conhecimento e discernimento das estruturas musicais, pois ao se construir uma obra com finalidade apenas e somente musical – mesmo pela improvisação – essa estrutura deverá ter um sentido que favoreça uma apreciação somente musical. Como obra musical, terá sentido em si própria, e então, já pode ser considerada uma linguagem. Dentro deste processo, é nessa instância que se inicia o desenvolvimento da habilidade musical criativa.  A partir daí, a escolha da matriz sonora, as escolhas da maneira de produzir o som e a criação de seções distintas nas improvisações tornam essa atividade uma atividade de composição, com maior ou menor liberdade de criação ou recriação dentro dela.


Devemos lembrar que improvisação é tanto o nome que damos à música, ao produto decorrente dessa atividade, como da própria atividade de tocar livremente, de participar dessas instâncias de pensamento imediato. Essas instâncias devem ser estimuladas tanto no início da educação musical como ao longo da vida do músico, seja ele um instrumentista, um cantor ou compositor.
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Monografia - monotonia



(Recebi ontem a devolutiva do meu projeto de monografia. Á'rduo, minucioso e admirável trabalho do professor responsável por nos orientar nessa primeira fase. Estou aprendendo muito e sou muito grato a todos e a tudo que me leva nesse sentido. Nesse projeto está a minha intenção de falar sobre um assunto que coloquei em dezembro aqui nesse blog. A monografia, pensei, pode ser uma chance de fazer esse estudo mais detalhado sobre o que já consegui falar. Mas, se é a monografia a melhor maneira de fazer esse estudo, como escrever de maneira menos pessoal e enxergar essa criatura como coisa nascida de mim?)

Apolo lamenta por Dionísio. Dionísio ri de Apolo.

“Eu não pensa, eu não diz nada, quem pode dizer é sempre outra pessoa.” Foi o que falou Apolo a Dionísio, quando esse insistia em colocar sua cara na monografia. Dionísio argumentou (aqui Dionísio, não só Apolo, argumenta): “Como poderás supor alguma coisa sem que antes eu lhe mostre que essa coisa exista? Conheces apenas o conhecido, te referes somente às coisas que outros já comentaram, só vê as coisas da maneira que os outros já viram. Não percebes que não falas? Só interpretas citações.”
Apolo que me perdoe, mas eu, Dionísio, tenho sempre coisas passando pela minha cabeça. Coisas sem pé nem cabeça, que brotam do pé à cabeça. Elas me movem. O pé e a cabeça atrás delas.
Eu divido meu corpo com Apolo. Apolo passa pelos mesmos lugares que eu, com seu corpo e com sua cabeça, mas ele conhece as coisas de uma maneira diferente de mim. Eu tenho prazer em sentir as coisas, em mexer nas coisas, até mesmo em diferenciá-las. Ele tem prazer em compreendê-las, organizá-las e até mesmo prever quando irão aparecer.

Só Apolo é convocado.

Monografia. Dionísio e Apolo quiseram se manifestar. Mas só Apolo foi convocado. Até ele sabe que depende de Dionísio para conhecer as coisas.
O trabalho mais árduo dessa dupla será dar um jeito de se colocar. Senão não valerá à pena.
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Arte é Educação


Tem tudo a ver com o que estamos estudando nesse curso!




Depoimento de Carlos Barmak - Consultor de Arte Educação


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Campos de atuação na mente de quem aprende, faz e ensina música


O que vou escrever agora é um esboço para algo que possa ser mais bem elaborado, com muito mais tempo, conhecimento, pesquisa e reflexão. Será o tema de minha monografia.

O que percebi comparando diferentes visões e ações no ensino musical é que há diversos campos de atuação na mente do aluno, na mente de quem executa o fazer musical, na mente de quem tenta ensinar o fazer musical.

Talvez o mais visível, mais próximo ao que pensamos como o fazer musical seja a atividade mecânica de tocar. Na maioria das vezes o processo de iniciação ao ensino de música é aquele em que o aluno vai a uma escola de música à procura de quem o ensine a tocar ‘tal’ instrumento escolhido previamente por ele. 

O singular é que, salvo exceções, os professores que recebem o aluno (ou o dono da escola), sendo as pessoas que detém o conhecimento da prática do ensino musical, não costumam fazer nenhum questionamento sobre essa via de entrada do noviço ao mundo musical. O que poderia ser questionado: Por que esse instrumento e não outro? Por que um instrumento e não vários? Por que um instrumento e não a voz? Por que aula de voz sozinho e não em grupo (coral)? Por que não começar com a musicalização (mesmo se adulto)?

Claro que existe aí a questão do aluno ser levado por uma combinação de diversos fatores objetivos e subjetivos que culminam no desejo de tocar tal instrumento e por isso mesmo essa escolha carrega uma eficiente carga de estímulo ao aprendizado musical. Mas não deveríamos, nós profissionais da área, darmos mais importância a esse questionamento? Sim. Mas normalmente não fazemos, principalmente se o aluno em potencial for jovem ou adulto. Por que?

primeiro campo a ser falado

Porque é natural. Buscar a música através de um instrumento é uma atitude muito natural. Porque a primeira via  ̶  a busca da manifestação do instrumento, essa manifestação bruta de primeiridade (cf. semiótica de C. Peirce - ver nota ao fim da postagem, vale à pena ler antes de continuar, principalmente se o leitor não conhece a teoria semiótica de Peirce), o mais visível ao fazer musical   ̶  é a atividade mecânica de tocar. Então o professor, sabedor de tudo, já orienta o aluno:“vamos lá, você já tem o instrumento? Comece segurando-o assim...”. Felizmente em muitos casos, antes disso o aluno já pegou o instrumento de qualquer maneira, brincou com ele, mexeu de tudo quanto é jeito.

Tocar no instrumento (por isso é esse verbo: tocar). É uma relação tão esperada, tão próxima, que não importa que na realidade o instrumento foi criado pelo homem para facilitar essa sua essência de manipulador dos sons da natureza. O que importa, ao olhar por esse viés, é que o homem é que foi criado para manipular esse objeto especial e desta forma extrair os sons que potencialmente estão lá. Aqui o homem é o real instrumento desta relação.

Relembremos lá no íntimo: quando olhamos para o instrumento, ávidos por tocar, não era como se ele tivesse vida própria, como se olhasse desafiadoramente para nós e dissesse: "Venha, faça-me soar! Revele toda beleza dos sons que posso produzir"?

Se o instrumento guarda em si a natureza de determinados sons ao homem resta ir a ele e buscar esse som, assim como um pintor pode ir em busca do azul. A manifestação sonora é bruta. É seu timbre acontecendo na altura qualquer que sair, pelo tempo que se revelou necessário para que pudesse mostrar sua existência. É uma manifestação original. É primeiridade pura.


Claro que quando buscamos a técnica para extrair esse som com controle entramos no campo da terceiridade, mas como necessidade de dominar o que foi revelado nesse contato direto, quando o som primordial do instrumento era o todo.

Baseados nessa necessidade foram desenvolvidos vários métodos que reúnem exercícios que graduam o domínio técnico-motor, nem sempre associados ao domínio de outras habilidades musicais, nunca associados ao domínio da linguagem musical como um todo. Na maioria das vezes faz, no máximo, ligação com o domínio da teoria musical e de algumas estruturas de organização sonora como intervalos, escalas, tonalidades, dinâmica, células rítmicas, articulações e outras.

Alguns dos autores consagrados e seus respectivos métodos: Suzuki, Klosé, Henrique Pinto, Vaccai, Hannon, Hal Leonard, etc. 


 A prioridade desses métodos é formar um aluno com alta capacidade de reproduzir sonsou seja, instância de secundidade, que é a relação direta com o instrumento produzindo os sons, e instância de terceiridade, que permite manifestar o som que deseja, na ordem que deseja (ou que alguém, o compositor, desejou). Instâncias que só existem em decorrência da primeira, nascida da necessidade de buscar o som que nos tocou, que nos causou espanto e catarse numa experiência primordial.



Reproduzir? Mas então quem produz? Ah, isso não é o problema de quem elaborou tais métodos, preocupados mais (ainda bem que alguém se preocupou com isso) em acabar com a frustração ter uma ideia musical na cabeça e os dedos não conseguirem realizar.



segundo campo a ser falado 

Então percebemos que ao aprendizado musical é muito importante se preocupar com o desenvolvimento de um pensamento musical, com o desenvolvimento de uma linguagem musical que nos permita elaborar mentalmente uma expressão musical, um arcabouço que nos permita criar música, que nos permita dialogar com outros músicos, que nos permita estabelecer uma comunicação com ouvintes (público passivo ou os músicos executantes). Mas, antes disso, a relação dual do som bruto com o manipulador de sons, instância da secundidade referida por Charles Peirce.


Quando ouvimos uma música nova o que é dela que nos chama a atenção? Por que geralmente mostramos essa música a outra pessoa?  O que nos faz querer mostrá-la a outras pessoas?
O que queremos compartilhar é a catarse provocada pela obra. Qual elemento faz essa catarse?

O leitor pode averiguar em sua experiências pessoais: quase sempre a catarse provém dos atributos de todas as instâncias (primeiridade, secundidade e terceiridade), que fervilham no momento da criação do que normalmente nos referimos como momento “genial” dentro de uma composição. Mas a idéia genial não pode ser lembrada sem que seja estruturada, e isso é campo exclusivo da terceiridade. Se não houvesse estruturação não poderíamos usar em composições, arranjos, orquestrações; só aconteceria nessas manifestações casuais de secundidade, que às vezes temos o privilégio de ouvir em algumas seções de improvisação livre ou mesmo de improvisação planejada, onde podem ocorrer casualmente. O que já foi "genial" num momento, como pode e deve ser estruturado e entendido e compartilhado e ensinado etc., não causa mais espanto, mas é o que existe o tempo todo numa composição; nem toda composição tem alguma coisa além disso, uma idéia que em algum momento do passado foi genial. Por isso uma composição pode ser muito boa sem ser genial;  pode ser uma obra prima sem ser genial.

Ensinar esse dom, o dom de ser genial, é possível? Acredito que sim, acredito que se o aprendiz de música (e  em música somos eternos aprendizes) puder vivenciar esses momentos de secundidade, esbarrando frequentemente na experiência dos "contatos imediatos de primeiridade", que é possível.


Em segundo lugar nos motivos de querer compartilhar com alguém a experiência de ouvir uma música, creio ser o encantamento pela performance, um encantamento semelhante ao sentido por ver uma habilidade circense ou esportiva. A habilidade do músico é secundidade pois é a instância do relacionamento do indivíduo com o seu instrumento. A performance depende também do conhecimento da obra, do estilo, de muitos detalhes como articulação e dinâmica. Isso já é instância da terceiridade. Lá no fim dos interesses poderia vir uma admiração por reparar habilidades de um músico como a capacidade de ler música ou pela capacidade de ouvir e distinguir sons, o que seria uma admiração bem cerebral, como a gente admira quem faz cálculos rapidamente.

Mas admito que muitas vezes o que me faz querer compartilhar a audição de uma música é o timbre, é esse contato com a primeiridade, a possibilidade de sentir no corpo aquele conjunto de ondas me acariciando o cérebro, me provocando sensações corpóreas indizíveis. Isso acontece ao ouvir um piano bom (um instrumento bom) ou outro instrumento até comum mas bem construído, cuja sonoridade passa pelos meus ouvidos com a mesma grandeza de sensações que só posso comparar ao ato de colocar algo na boca de sabor apropriado (um chocolate, um vinho, uma lichia), só comparado às sensações de carinho, de sexo, ou seja, sempre sensações de qualidade pura, sem se importar com a estrutura musical, com o acorde, com outras interpretações.

Mas voltando à secundidade, esta presumo ser a área do desenvolvimento da genialidade. É a área da experimentação sonora, da improvisação espontânea, do “insight” de uma composição. É o terreno considerado por muitos educadores como área difícil de ser invadida, área que parece pertencer somente a umas poucas cabeças privilegiadas*1. É a manipulação dos sons e das idéias musicais antes que elas se estruturem, antes que sejam lhes dada forma, antes que se submetam a leis. É área desenvolvida em algumas instâncias do que Koellreutter chama ensino pré-figurativo.
Aqui incluímos a propensão do homem em achar sons e que, para isso, procura na natureza um meio de dominá-los, guardá-los, colocá-los num recipiente. E isso, na prática quer dizer criá-los, pois é o único meio de se apoderar dos sons da natureza, inclusive, e mais, o que é muito importante, aperfeiçoando os sons da natureza e inventando os sons que na natureza não encontra. Também nesse campo da mente está essa volição do homem (o luthier), que cria uma ferramenta, um instrumento para fabricar os sons que anseia.


*1 Esse pensamento é fruto de uma educação musical que receberam e que tendem passar à diante. Esse pensamento está muito arraigado nas escolas brasileiras. Infelizmente a maioria dos nossos professores de música pensa assim. Isso não os torna professores ruins. Apenas limitam o desenvolvimento dos alunos às capacidades desenvolvidas nos primeiro e terceiro campos referidos nesse artigo. É também interessante ver essa separação: professores que desenvolvem o primeiro campo falado são os professores de prática de instrumento musical (aí também os professores de canto e técnica vocal); professores de teoria, percepção, composição, improvisação, análise, musicologia, etc., são os que desenvolvem o terceiro campo de atuação.

Nesse contexto estão os educadores como Schafer (em “Limpeza de Ouvidos”) e Self.


terceiro campo a ser falado

Mas se temos ideias musicais na cabeça e “os dedos ainda não respondem com rapidez e eficiência” por que não procuramos nos expressar através da voz*2, que normalmente nos obedece com mais facilidade?
Ao fazermos os primeiros voos musicais utilizando a voz, percebemos que se não há um treinamento do raciocínio, da linguagem musical, se não houver um exercício de associações mentais com estruturas pré-estabelecidas, a performance, a realização musical é comprometida.

Esse treinamento musical foi o foco de muitos educadores, entre eles Hindemith, Dalcroze, Willems, Kodály, e aqui no Brasil, Gramani, Gazzi de Sá, Villa-Lobos, Bohumil Med, Lucas Ciavatta, entre diversos outros.
É interessante ver a quantidade de educadores preocupados com esse campo de aprendizado musical. Esse saber se situa entre o tocar (manifestar o som) e a necessidade de tocar. Talvez por isso, por ser tão intelectual e sujeito à soberba, que muitas pessoas tem a tendência de sobrepujar sua importância. É aqui, também, o campo onde se desenvolve a habilidade e o domínio da composição, do arranjo, da orquestração, da análise musical, da crítica, da história, etc.

*2 Falo da voz como a manifestação sonora mais diretamente ligada ao pensamento, realizada por um corpo que não tem “lugar a apertar para que se produza essa ou outra nota musical”.



associação dos campos
 
Bom, pela maneira que foi aqui apresentado, creio que é natural acreditar que a indução ao desenvolvimento completo de um músico só poderia acontecer se conseguíssemos agregar ao ensino estes três campos do fazer musical.

Mas há quem já tenha tentado? Há quem já o faça? Parece não haver incompatibilidade entre estes campos. A incompatibilidade acontece entre as diferentes visões de valores que interferem no modo de atuar dentro de cada campo.

Koelreutter,  Paynter, Schafer (em “Um rinoceronte na sala de aula”)  e Swanwick*3 trabalham nessa perspectiva de educação musical, buscando uma formação total que integre estas atividades educativas que atuam em categorias tão diversas do fazer musical.


Me parece tão poucos. Me parece também que é nesse aspecto de agregar estes três campos que reside o sucesso de uma educação musical para ser aplicada tanto a um plano de atuação individual (cada professor conseguindo estar atento a todos esses processos de aprendizagem) como para ser aplicada a uma escola ou a uma nação. Não é a defesa de um determinado método a ser aplicado, mas a simples observação de integrar esses três campos de atuação do pensamento no fazer musical.




*3 Conforme se resume a sigla do pensamento de Swanwick: T.E.C.L.A. (Técnica, Execução, Composição, Literatura e Apreciação), parece que essas atividades estariam contemplando a atuação nesses três campos. Também nesse sentido de integração existe a educadora Ana Mae Barbosa, que chama de proposta triangular o que é apenas a enunciação de três processos que são importantes para aprender e para organizar a mente em relação à aprendizagem: o fazer, o apreciar e o contextualizar (apesar de que o Fazer tem que ter as atividades de tocar para desenvolver técnica, tocar para praticar a fluência musical, atividade de improvisar e atividade de compor, senão não se encaixa nessa integração desses três campos).



Essa entrevista me tirou algumas dúvidas: http://revistaescola.abril.com.br/arte/fundamentos/entrevista-keith-swanwick-sobre-ensino-musica-escolas-instrumento-musical-arte-apreciacao-composicao-529059.shtml
Como um aluno aprende Música?
SWANWICK Procurei responder a essa questão por meio de uma pesquisa com estudantes de Música ingleses com idades entre 3 e 14 anos. Aprendi que o desenvolvimento musical de cada indivíduo se dá numa sequência, dependendo das oportunidades de interação com os elementos da música, do ambiente musical que o cerca e de sua Educação. Com base nessas variáveis, posso dizer que o aprendizado musical guarda relação com a faixa etária. Cada uma corresponderia a um estágio de desenvolvimento.

Quais as características de cada um desses estágios?
SWANWICK
O primeiro vai até mais ou menos os 4 anos. Sua marca principal são experimentações, com as crianças batendo coisas e explorando as possibilidades de produção de sons de cada instrumento. No segundo estágio, que vai dos 5 aos 9 anos, essa manipulação já funciona como uma forma de manifestação do pensamento, dando origem às primeiras composições, muito parecidas com as que os pequenos conhecem de tanto cantar, tocar e escutar. As criações se tornam mais variadas e supreendentes a partir dos 10 anos, num movimento que chamo de especulativo. Em seguida, já no início da adolescência, as variações passam a respeitar os padrões de algum estilo específico, muitas vezes o pop ou o rock, "idiomas" em que é possível estabelecer conexões com outros jovens. Por fim, a partir dos 15 anos, é possível desenvolver um quarto estágio, que engloba os outros três, em que a música representa um valor importantíssimo para a vida do adolescente, marcado mais por uma relação emocional individual e menos por modismos passageiros ou algum tipo de consenso social.

Que aspectos devem ser considerados no ensino de música nas escolas?
SWANWICK
O fundamental é que os conteúdos sejam trabalhados de maneira integrada. Nos anos 1970, resumi essa ideia na expressão inglesa
clasp. Além de ser uma sigla, um dos sentidos dessa palavra em português é "agregar". Proponho que há três atividades principais na música, que são compor (a letra C, de composition), ouvir música (A, de audition) e tocar (P, de performance). Essas três atividades, que formam o CAP, devem ser entremeadas pelo estudo da história da música (L, de literature studies) e pela aquisição de habilidades (S, de skill aquisition). (No Brasil, esse processo ficou conhecido como TECLA: T de técnica, E de execução, C de composição, L de literatura e A de apreciação.)

Qual a vantagem de trabalhar nessa perspectiva?
SWANWICK
Um ponto forte é considerar que todas essas coisas são importantes e que devem ser desenvolvidas em equilíbrio. A ideia do
clasp também pode ser útil para o professor perceber se está gastando muito tempo, digamos, no L, descrevendo fatos históricos e desenhando instrumentos, por exemplo. Dar muito enfoque à história da música é uma forma simplificadora de achar que se está ensinando Música. Acontece que a história não é música - ela é sobre música. O mesmo excesso pode ocorrer com docentes que atuam na classe o tempo todo como intérpretes ou outros que apenas colocam CDs para a apreciação.




nota ao fim da postagem: "Considerando experiência tudo aquilo que se força
sobre nós, impondo-se ao nosso reconhecimento, e não
confundindo pensamento com pensamento racional (deliberado
e auto-controlado), pois este é apenas um dentre os casos
possíveis de pensamento, Peirce conclui que tudo que aparece
à consciência, assim o faz numa gradação de três propriedades
que correspondem aos três elementos formais de toda e
qualquer experiência.
Em 1867, essas categorias foram denominadas:
1) Qualidade,- 2) Relação e 3) Representação. Algum tempo depois, o termo Relação foi substituído por Reação e o termo Representação recebeu a denominação mais ampla de Mediação. Mas, para fins científicos, Peirce preferiu fixar-se na terminologia de Primeiridade, Secundidade e Terceiridade, por serem palavras inteiramente novas, livres de falsas associações a quaisquer termos já existentes." (Lucia Santaella - O que é semiótica - Ed. Brasiliense)
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